Quem você não pode ser quando crescer, ou quem não quero (continuar a) ser enquanto eu crescer
Ler a ouvir: Doing My Best - Hazlett e So Long - The Lumineers
Tenho mania de grandeza!
Cheguei a essa constatação, não pelas vias que costumamos empregar essa frase, mas por observar a exigência que tenho com meu desempenho e com a pouca valorização pelas contínuas pequenas e bonitas coisas, que realizo frequentemente.
Essa edição pode ser um puxão de orelhas pessoal, uma abertura de olhos para quem se identificar com as linhas aqui organizadas ou apenas um impulso do meu ego na tentativa de me autopromover, enfim, espero que seja como for, que valha a pena a leitura. Então vamos lá, não me abandone. 🤞🤝
Em meio a dias e momentos que parecem abrir ou fechar oportunidades, recentemente me deparei com uma nota aqui no Substack e sinceramente queria, mas não me recordo quem a postou e também não tenho certeza do que ali estava escrito tá confuso, mas vai melhorar, porém, o que absorvi depois da leitura daquela pequena postagem foi a constatação da frase que iniciei essa edição.
Quantas voltas May, quantas voltas!…
Vamos lá, passei anos da minha vida convicta de que quanto mais eu produzisse em termos de trabalho, estudos (formação certificada), tivesse uma filha perfeita, mais aumentaria meu senso de valor. A mudança para Portugal, depois da chegada da Alice, certamente foi o marco mais importante da minha vida, ser imigrante, ficar desempregada, enfrentar o confinamento, as incertezas sociais e pessoais, sem alternativas confortáveis, todas essas circunstâncias e mais aquilo que não se resume em poucas linhas, se tornaram o meu tendão de Aquiles.
Sentir que perdeu tudo ou que não se tem nada, pode ser um ponto de declínio para muitos (para mim inclusive), mas o passar dos anos e o distanciamento do arder das chamas do acontecimento ainda fresco, permitiu-me o relaxamento para refletir e digerir o aprendizado contido nessa experiência vivida.
Perder tudo, não ter nada, pode ser muito e muita coisa envolve complexidades. Obviamente que perder trabalho, progressão de carreira, status, não poder estudar, o não exercício de sua profissão de formação, entre outras limitações, realmente, pode e comumente deve nos frustrar. Dos muitos questionamentos que me alcançaram, o último deles que me chegou, depois do longo período de caminhar das águas foi de que, talvez o conceito de perder tudo fosse apenas simbólico e não ter nada é um exagero desnecessário.
Considerando que, não perdi familiares, tive saúde, mantive alguma dignidade em minha sobrevivência, não ter nada, expressava minha sensação de descontentamento, diante daquilo que eu discordava, de um ponto de vista até derrotista. Em dado momento, ao navegar nessa sensação de constante desconforto que me aprisionei, percebi que essa sensação existia, porque para alcançar minha satisfação eu preciso alcançar feitos externos, meu senso de valor exige que essas conquistas sejam palpáveis para que os outros vejam, dentro de moldes formatados e de alta exigência é que se deu minha definição de sucesso pessoal.
Não quero dizer que, na minha percepção, ter metas e alcançá-las, seja somente sobre exibicionismo, mas no meu caso, minha felicidade não se dava por eu me realizar meus objetivos, mas sim, pela crença de que minha valorização e pertencimento só viriam dentro das definições desses contornos, que o sucesso e a realização seja resultado da equação social FAZER+TER. Excluindo alcances e conquistas cotidianas como “aguentar” mais um dia difícil, mesmo ao não dar conta, mas lutar contra às adversidades, ter medo de encarar crenças e padrões e ainda assim, não deixar de enfrentá-los.
Entretanto, agora reconheço que as pequenas vitórias, aquelas que ninguém vê, são como sussurros que não se ouve, mas que devem ser comemoradas, não necessariamente expostas, porque se calhar, nem todos irão compreendê-las, mas individualmente, silenciosamente e orgulhosamente, devemos nos abraçar e parabenizar por cada pequena e bonita coisa, que continuamente realizamos/conquistamos, porque elas podem até não ser grandes fora de nós, mas devemos nos lembrar e orgulhar, porque inegavelmente são elas que nos sustentam para chegarmos mais perto das realizações externas.
Por isso, durante muitos anos da minha vida eu me dediquei em ter alto desempenho escolar, acadêmico, profissional, ter um, dois, três e quantos mais trabalhos eu pudesse dar conta e depois me virar para os manter, porque eu não reconhecia o valor inestimável dessas pequenas realizações.
Engraçado, não no sentido literal, que no decorrer da vida, as vezes, que tive algum tipo pane no sistema (mente), foram as que eu estava mais na ativa e me sentindo como uma maratonista de alta performance, porque estava realizando coisas incríveis, até para minha expectativa e esperança mais otimista eram impossíveis de alcançar, assim, “facilmente”.
Acontece que, fácil é uma palavra muito incomum na vida de um tantão de gente e tal qual a mim, ainda que não percebesse, numa posição mais distante e de observação foi possível ver que neste panorama as coisas não estavam a ser fáceis, eu vivia me comprometendo com diversas tarefas simultâneas, porque eu precisava comprovar e acreditar que eu era capaz, tanto de realizar coisas, como também de merecer visibilidade, reconhecimento externo, a verdade que ninguém me contou é que no fundo não importava o quanto eu continuasse me desdobrando e dando check em múltiplas tarefas, aquilo era desumano comigo e sinceramente, ninguém deveria ter que se submeter a “grandes feitos” para se sentir merecedor de admiração.
Entretanto essa armadilha da necessidade de aprovação para alimentar nosso senso de valor, disfarçada de esforço e dedicação compulsiva é o que nos prende nesse ciclo contínuo por cumprir, entregar e ainda se auto desvalorizar ao dizer silenciosamente algo como: não sou boa por ser quem sou, nem por fazer o que faço, mas devo aceitar fazer mais do que posso para não perder o valor do que já realizei.
Ao refletir e dar essas voltas em meus próprios pensamentos - em mim mesma? - acabei por me agarrar numa ponta dessa linha e ao puxá-la, a medida que a contornava me trouxe compreensão de sua proporção e sua percepção me trouxe clareza sobre alguém que fui e que talvez ainda esteja a carregar, mas certamente, quero desconstruir com respeito e responsabilidade essa May com “mania” de grandeza.
Quero delicadamente, calar minha voz que me diz, que não basta genuinamente ser quem sou, carregar meus anseios, batalhar pela construção da minha vida digna e pautada em valores não apenas pessoais, mas também sociais. Porque não quero mais ouvir de mim, nem acreditar, que meu valor é menor por eu não estar a realizar os feitos e estar onde meus objetivos e projeções gostariam que eu estivesse.
A verdade é que, a cada dia eu posso estar mais perto de onde quero estar, ou não, whatever, mas pensar sobre essas questões me ajudou a compreender que felizmente a transformação, o crescimento e aprendizado não acontecem apenas sob os olhos dos outros, ou seja, muita coisa grande e bonita precisa de reclusão, espaço interno, silêncio e sombra para se consolidar e germinar evolução.
Provavelmente em nível social, seja impossível definir o valor dessas pequenas grandes coisas, que assim carinhosamente as nomeio, tanto porque vivemos numa sociedade que valoriza o capital material e isso está longe de ser estimado em números e exatidão.
No entanto, especulo que nos tentam afastar do conhecimento e certeza sobre nosso real valor, porque nessa equação, quanto mais priorizarmos dar check nos feitos da escalada social, mais nos afastamos de nós, da nossa humanidade e estamos mais frágeis para adoecer e comprar a ideia de que a culpa pelo “fracasso” é exclusivamente nossa; que não estudamos, enquanto eles dormiam, que não trabalhamos mais para alcançar degraus mais altos dessa ascensão supervalorizada.
Contudo, essa questão é mais profunda, delicada e rende pano para manga, por isso, deixaremos para outra edição.
Antes de partir:
Gostaria de esclarecer que não estou desvalorizando o esforço, nem atacando ou indo contra quem está no caminho inverso do qual estou tentando me guiar. Cada um tem seus anseios e a régua de sucesso é ou deveria ser particular, então não sou ninguém para impor a minha medida, apenas acho importante que todos nós tenhamos consciência do que se perde, do que se deixa e se aquilo que estamos a valorizar, não nos desvaloriza e desumaniza.
Quase que de esbarrão, ao transitar pelo app do Substack encontrei o texto abaixo da
Outra indicação é essa edição escrita em parceria pela
e , queFicamos por aqui? Espero que tenha feito algum sentido e você que chegou neste ponto e quiser partilhar seu comentário e opinião sobre esse e outros temas, saiba que adorarei ler-te.
Beijinhos sabor café com gelado de caramelo salgado e até a próxima.
Com uma revolta afetuosa e carinho
May
Essa questão do valor é uma das coisas que mais me pega na vida.
Uma vez, em conversa com uma amiga, estava falando sobre onde eu gostaria de estar e não estou, e ela disse: "Se todas as pessoas perdessem tudo o que tem agora, o que sobraria? Amiga, você é rica! A riqueza maior que podemos ter é essa que está dentro. É a sua vontade de aprender, crescer, evoluir." Reconhecer o nosso valor como seres, o intrínseco, e a nossa intenção de seguir, já é tanto...
Obrigada por me citar, fiquei feliz demais quando recebi a notificação. ❤️
Um abração! 🫂😘